quinta-feira, 26 de novembro de 2009

...um homem também chora

Queria eu poder escrever toda vida que os pensamentos vibrassem em minha mente. A maioria dos que vibram não passam de impulsos nervosos que por aqui dentro se perdem. Mas vagando por estes sertões e reencontrando os amigos que lá deixei, torno a conhecer muitas histórias; histórias que merecem ganhar vida; histórias que merecem ser analisadas – e não serem apenas mais um daqueles impulsos.
Dia desses, um sertanejo amigo meu me disse que já havia sido atendente de uma grande empresa. Tinha de fazer cobranças, papel chato. O mais estranho ali era justamente um sertanejo “operador de telemarketing” - como chamam na capital. E foi isto que me fez criar atenção, sentar e escutar o que estava por vir.
Meu amigo me contou diversas situações engraçadas. Chorei de rir. A barriga já doía. Naquele momento, pensei que ser esse tal atendente pudesse até ser a profissão mais divertida do mundo. Pensei também que havia encontrado a resposta para a tão perturbadora questão do vestibular. Meu futuro estava definido!
Mas não podia afirmar isso. Não tão cedo. Pela primeira vez me colocava no papel oposto ao que sempre estive. Já sabia como era inconveniente receber ligações de cobranças – sei das minhas dívidas! - e conhecia a forma robótica como esses atendentes se comportam. Mas naquele dia eu estava descobrindo a ligação da perspectiva de quem diariamente discava os números atrás do pagamento de alguns boletos.
Escutar o colega foi como ouvir a leitura de um livro de crônicas de uma só vez. Uma das histórias me interessou mais. Nesta, meu amigo contou que certa vez teve de cobrar uma senhora já de idade. Ligou para sua casa e avisaram que ela não estava. Bom, não estar em casa é algo supernormal. Mas quem atendeu tratou de justificar: ela tinha ido ao velório de seu filho. É nesse ponto que o chão do tão robótico atendente desabou. Como cobrar alguém que havia acabado de enterrar o próprio filho?
Meu amigo teve de ligar novamente outro dia. Era essa sua função. Respirou fundo e sentiu do outro lado uma voz mansa atender ao telefone. Era a senhora que ele deveria cobrar. Bastou se identificar como funcionário da empresa credora para a senhora começar a falar. Ela havia recebido o recado da ligação anterior e repetiu a justificativa de que estava no velório. E disse que ninguém poderia imaginar a dor que ela estava sentindo; a pior dor que poderia existir no mundo: perder um filho. Enterrar um filho, ainda com tanto para viver. Como pensar em alguma outra coisa? E se desculpou. Desculpou-se muito.
Do outro lado, não mais um robô falava, mas sim um homem chorava. Porque atendentes de telemarketing também são gentes, por mais incrível que possa parecer.

3 comentários:

Camila disse...

Caramba, pesado.
Fez-me até repensar as histórias que invento pra escapar das famigeradas ligações. De qualquer forma, é interessante ver uma outra perspectiva, porque eu, pelo menos, tinha a idéia de que os operadores de telemarketing só faziam aquilo, como meras máquinas, exatamente como é conveniente que se veja.

Anônimo disse...

Claro que não. Sabe quanto eles ganham pra fazer aquilo?
E a maioria são mexicanos. Não dá nem pra entender o que eles dizem.
Meu avô costumava perguntar se o emprego deles oferecia plano odontológico.

Anônimo disse...

Sabes que o meu amigo o qual nem preciso descrever é atendente de telemarketing, agora?
ô