quarta-feira, 31 de março de 2010

...russô já dizia

Chegando a casa, vimos aquele clarão no céu. Era lua cheia, bem grande e imponente. Foi aí que meu irmão soltou: “nossa casa tem vista pra lua”. Fantástico isso, não?
Pode parecer óbvio, mas faço questão de dizer que foi meu irmão pequenino quem disse isso. Uma frase que por vezes pareceria boba, mas que demonstra toda a ingenuidade da criança de ainda falar coisas aparentemente ilógicas.
Quem se interessaria por uma casa com vista para a lua? Qual seria o corretor que anunciaria seu produto tendo essa opção de paisagem? Tenho certeza de que muitas crianças seriam atraídas por um anúncio desses, porém não são elas que ditam essas coisas. Os adultos, figuras que realmente decidem a localização de um lar, por exemplo, não se interessam por luas. Muitos até fingem gostar do mar, da mata - são raras as vezes que se lembram de que há tudo isso lá fora.
O gosto pelas coisas banais da vida parece ser inversamente proporcional ao tamanho. À medida que o homem vai crescendo, deixa de lado a capacidade de apreciar as coisas simples. A criança é considerada crescidinha quando já fala o que os adultos querem ouvir: aquelas coisas ilógicas dão lugar às construções pragmáticas. Crescer é parecer um pouco mais coerente para o mundo.
Não sinto nenhuma vontade de ser totalmente compreendida. Se parecer lógica é apenas afastar-se do êxtase que trazem as coisas mais ordinárias, podem me considerar insana. Tudo isso só vai provar que a sociedade ainda corrompe o homem. E sempre.

terça-feira, 30 de março de 2010

...e fiquei na saudade

Peço licença, mas hoje tenho que parafrasear Martinho da Vila. Se ele disse já ter tido muitas mulheres, digo que já tive muitos professores. De todas as cores, de várias idades e também de muitos amores: números, letras, sonhos...
Meu saudosismo efervescente – nunca negado – traz à tona bons momentos de aula, sejam entre quatro paredes ou não. Estava sempre ali presente a figura do professor, meio ninja, meio louca. E não vá pensar que a loucura era ruim: encantava. “Sou o único lúcido desse mundo”. Quantas vezes não se repetiu essa frase? Louca, como tantas outras.
Assistir a uma aula era como embarcar em uma viagem sem destino certo. Talvez, o destino já tivesse sido traçado minuciosamente pelo professor – e hoje tenho motivos para crer nisso -, mas nós nem cogitávamos que aquela viagem tinha sido pensada anteriormente. Era tudo tão espontâneo. Retiro meu “minuciosamente”, já que algumas particularidades da aula são imprevisíveis e os detalhes são carimbados por cada grupo.
Entrávamos no clima da discussão. Éramos desafiados, instigados, atiçados! Pequenas crianças que aprendiam que não possuíam lábia, mas eloqüência. Que mostravam seu potencial, mesmo sem perceber, e possuíam espectadores que confiavam nesse potencial. Éramos rodeados por verdadeiros professores. Vibrantes.
Ainda não consegui transcrever aqui o que realmente queria dizer. Estou chegando à conclusão de que nem conseguirei esse feito. Tenho, porém, a felicidade de saber que a sensação mora em mim. Essa percepção de ter compartilhado sonhos com meus professores. De ter podido ir mais além do que o roteiro determina. De ter seguido devaneios aparentemente sem nexo, que hoje descubro terem sido umas das coisas mais lógicas que já fiz.
São lembranças que o tempo não desfaz, mas das quais sinto falta. Queria reviver algumas das manhãs passadas, e, por curtos momentos ao menos, ouvir novamente algumas vozes inesquecíveis.
Se eu fosse Martinho da Vila e estivesse terminando esse texto, não diria se eram solteiros, casados, cabeças ou desequilibrados. Diria apenas que eles não foram mentira, eles são verdade.

segunda-feira, 29 de março de 2010

...questão de segurança

Acabo de entender porque alienação é tão útil. E não falo em utilidade para o sistema, para as instituições arcaicas. Ter a cabeça oca é uma necessidade para manter a sobrevivência da sociedade.
Dia desses, um dos professores – dos milhares que se revezam numa mesma manhã – falou que os pêlos dos ursos polares são ocos e isso faz com que o animal sofra menos com a baixa temperatura do ambiente em que vive. Eureka! O vácuo age como isolante.
Sendo assim, pensemos: quando mais vazia for a sua cabeça, menos influência terá o ambiente sobre você. Certo? Danem-se os críticos que dizem que um alienado social é facilmente manipulado. Derrubem os clichês do consumista-alienado, do trabalhador-alienado, do cidadão-alienado.
Isolamento mental é segurança. Vamos avisar aos estudiosos-pseudointelectuais-divulgadores-de-estudos que queremos continuar nessa condição. E, assim como os ursos polares que não sofrem com o frio, nós, alienados, estaremos menos sujeitos às adversidades da vida.